Sua Aventura





Viajar é Preciso !

Por Janer Cristaldo - janercr@terra.com.br

Viajar é o mais requintado dos prazeres do espírito. Não permaneça imóvel na beira da ferrovia olhando os trens que passam. Parta, que a vida é curta !

Nasci no campo e só fui conhecer cidade aos dez anos. Para chegar até a cidade, percorri de bicicleta 60 km de uma estrada de barro e areia. Verdade que a cidade decepcionou-me um pouco. Por influência de contos de fadas, fantasias orientais, eu imaginava a cidade como algo dourado e cheio de luzes. À medida que pedalava, fui entrando num conglomerado de casas mais ou menos cinza e com ruas poeirentas. Então aquilo era a cidade? Paciência. Nem sempre se come pão quente. As cidades douradas e cheias de luzes, tive a ventura de conhecê-las mais tarde.

A imobilidade sempre me assustou. Antes de conhecer as cidades douradas e cheias de luzes, quando ainda existia trem no Brasil, fiz várias vezes o trajeto entre Dom Pedrito e Porto Alegre. Nessas viagens, eu procurava o último vagão, abria a última porta e me sentava nas escadinhas que davam para os trilhos. A paisagem ia fugindo, entremeada de casebres ao longo da ferrovia, casebres frente aos quais o trem jamais parava. Eu tentava imaginar a vida daqueles tristes seres, sempre imóveis, vendo o trem passar todos os dias e sem ambição alguma de viajar. Sentia-me um privilegiado, passando, enquanto eles eternamente ficavam.

Os contos de infância são poderosos. Mal saí da faculdade, qual um Schliemann em busca de Tróia, fui à conquista das cidades douradas. O pai de Heinrich Schliemann costumava ler para o filho os versos de Homero, mas jamais lhe passou pela cabeça que Tróia existisse. O pequeno Heinrich acreditava em Tróia. O pai dizia que tudo não passava de lenda. Certo dia, quando Heinrich trabalhava em um bar, ouviu estudantes recitando Homero em grego antigo. E lembrou-se: eu preciso descobrir Tróia ! (A propósito: se alguém anda com vontade de ler algo fascinante, procure em algum sebo Schliemann ! "História de um Buscador de Ouro", de Emil Ludwig. É uma das mais fascinantes aventuras do espírito humano). E acabou descobrindo-a. Mais ainda: reuniu um grupo de gregas e escolheu entre elas sua mulher, a que mais se parecia com Helena. Ela aproximou-se de Heinrich recitando Homero em grego antigo. Ao casar, engalanou-a com as jóias de Helena.
Divago !

Comecei a viajar e não parei mais. Em Estocolmo, fui contaminado por uma insidiosa doença nórdica, a "Resfeber" -Febre de Viagens, em bom português. É doença que não tem cura. Uma vez contraído o vírus, você acaba viajando até morrer. Bem entendido, nunca consegui amealhar patrimônio sólido. Ppedra que rola não cria limo, diz-se na fronteira gaúcha. Mas resta sempre um patrimônio mais valioso. Aprendi isto com uma amiga sueca. Era guia de turismo, profissão reprovada por sua família, já que não levava a grandes ganhos. Estávamos nos anos 70, quando o fantasma soviético ainda rondava a Europa. Meus pais reclamam ! me dizia Lena ! Mas se os russos invadirem a Suécia, podem tomar minhas posses. Mas minhas viagens eles não levam !

Não que as cidades fossem exatamente douradas. Mas eram cheias de cores durante o dia e cheias de luzes à noite. Brancas de neve, ocres e vermelho-salmão, com cúpulas douradas com a pátina verde do tempo, e de um dourado esplendoroso no outono. As estações são pouco pronunciadas entre nós e quem nunca saiu do Brasil nunca viu um outono. Como também nunca viu um inverno. Nem talvez uma primavera. No Brasil, em verdade, só existe verão.

Há quem inveje, no bom sentido, minha vida errante. Em vez de invejar, melhor seguir-me. O deslocamento no planetinha democratizou-se nas últimas décadas. Se você deixar de lado veleidades como casa na praia, carro próprio e outros sinais de status, toda viagem é viável. Desde que você não viva de salário mínimo, bem entendido. Sempre que pensei em comprar carro, ao mesmo tempo ponderava: mas isso dá dois meses na Europa. Assim sendo, até hoje não tenho carro, nem idéia do valor de IPVA, multas, flanelinhas e preços de parking. Minha memória só retém matéria nobre: o sabor de um cochinillo no Sobrino de Botín, o bouquet de um Rioja no El Espejo, o odor acre de uma andouillete no Charpentiers, o chapéu encantador de uma menina no Relais de um Odéon, uma brisa de primavera em Budapest arrepiando os braços, uma noite explodindo de estrelas nas montanhas de El Assekrem, o silêncio divino junto aos ventisqueros na Patagônia, cachoeiras caindo em Geiranger, um sol paranóico brilhando à meia-noite em Tromsø. Memória é para guardar lembranças boas. O fisco me extorque, é verdade. Mas minhas viagens, não há político que as roube.

Se há quem me inveje, eu invejo não poucos leitores. Invejo, devo confessar, todo aquele que ainda não viajou. Este ainda tem preservada a excitação da descoberta, emoção que perdi para sempre. As cidades douradas me calaram tão fundo na alma que quando viajo tenho a sensação de estar voltando para casa. Como as cidades têm sempre uma estrutura semelhante, todo novo para mim é déjà-vu.

Ano novo, grandes propósitos. Aos leitores que invejo, aqueles que ainda não partiram, minha sugestão: partam logo. Se a meta for Europa, partam com urgência. Neste réveillon, 425 carros foram queimados na grande Paris. Segundo o Le Monde, apesar dos temores, a noite do réveillon ocorreu sem maiores incidentes. Quando o mais importante jornal francês considera que 425 carros queimados em uma noite não constitui maior incidente, está na hora de partir antes que a França vire um Iraque.

Dispense excursões. Salvo para certos países ou regiões para onde é impossível viajar só, excursão é recurso de covardes, de quem teme enfrentar uma língua estrangeira ou renuncia ao prazer de perder-se nas vielas e meandros de cidades milenares. Nada mais prazeroso do que perder-se em uma noite silente nas ruela de Veneza ou Amsterdã, sem ter para quem perguntar qualquer coisa, tentando achar uma rua e sempre caindo nos canais.

Não se assuste com línguas que mais parecem doenças da garganta. Mesmo que você não entenda a língua do país onde está, a arquitetura, o traçado das ruas, os transportes, a gastronomia, os incidentes do dia-a-dia vão ensinar-lhe alguma coisa. Mesmo um analfabeto, ao voltar de uma viagem, volta menos analfabeto. Leve uma bibliografia mínima sobre as cidades que pretende visitar. Ler é inerente à viagem e torna o anecúmeno compreensível. E fuja de cidades que não têm bares nem restaurantes nem álcool nem jornais. Bares e restaurantes são as salas de estar com que um país o recebe. Se não há salas de estar, é porque você não é bem-vindo.

Viajar é o mais requintado dos prazeres do espírito. Não permaneça imóvel na beira da ferrovia olhando os trens que passam. Parta, que a vida é curta. E a Indesejada das Gentes sempre é imprevisível. Viagem é patrimônio inalienável. Se o país afundar, se você entrar em falência, sua memória guardará um amplo acervo de bens que não podem ser alienados ou embargados.

Bom 2006 e muita água sob a quilha !




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DICAS DE VIAGEM




 

Mapas Peru - http://www.mtc.gob.pe/portal/transportes/red_vial/mapas_redvial.htm
Mapas Chile - http://sedoparking.com/turistel.cl

J) Viajar com Garupa

Trata-se de algo que tanto pode gerar um grande prazer, principalmente para quem não gosta de viajar em grupos, quanto um grande incômodo. Tudo depende do ponto de vista e pretensões individuais. Alguns gostam de viajar com a(o) companheira(o), outros não ! Alguns se vangloriam de ter uma boa companhia, outros reclamam a falta dessa. Assim, àqueles que valorizam esse aspecto ou simplesmente querem saber mais a respeito, recomendamos a leitura do texto Garupa ou Co-Piloto, de autoria do motociclista (e grande viajante) Ricardo Lugris, onde esse dá ótimas e importantes dicas nesse sentido.


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Debaixo de Chuva
Estradas vicinais, em terra, sempre são um convite à aventura. Adicione a isso muita chuva, lama, fazendas, vinícolas e cidades do interior paulista e mineiro e o resultado será emocionante...

Texto: Egon Jenckel Fotos: Trinity Ronzella
Muitas vezes, a chuva é inimiga dos motociclistas durante suas viagens. No entanto, pilotar sob chuva também é agradável, por isso montamos um roteiro que pode ser feito em dias de sol ou de chuva. Nosso destino escolhido foi Mogi Guaçu, que dista 170 km da capital paulista e fica próximo à divisa com o sul de Minas Gerais.



A região Mogi Guaçu surpreende quem se aventura por suas estradas vicinais, tanto que, a bordo de uma Honda XRE 300 e uma Yamaha XTZ 125, decidimos explorar esses caminhos de terra em busca de paz e natureza. Uma vez que na ocasião chovia muito, também ficamos na expectativa de uma melhora no clima.

Na Terra
A partir de Mogi Guaçu, temos algumas opções de estradas secundárias para explorar, com muita terra e pouco asfalto. Para chegar ao início desse caminho que percorremos, basta seguir no sentido do bairro da Roseira, em Mogi Guaçu. O asfalto acaba nesse bairro e depois siga, já em estrada de terra para Espírito Santo do Pinhal. Detalhe, não existe placas informando o caminho, você terá que perguntar.


Por estradas de terra, acompanhamos a mudança de relevo, que já era visível ao longo do horizonte. Quanto mais avançávamos, menos carros e terrenos planos encontrávamos. E tudo sob chuva, o que deu um “tempero especial” à viagem. Não tínhamos poeira, mas barro – muito barro! Nesse trecho surgem plantações de café, cana-de-açúcar, eucalipto, laranja e pecuária de corte e leiteira.

É uma região muito bonita, com construções antigas, vegetação exuberante e um relevo bem acidentado. Devido às chuvas, muitos pontos estavam intransitáveis para as motos, mas desde que sejam modelos off-road a viagem fica muito mais emocionante.

Fonte: Revista Motoadventure- junho-2011

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